Brasil entra na era do boi transgênico
Luiz Sergio de Almeida Camargo, médico- veterinário e pesquisador da Embrapa Gado de Leite, de Coronel Pacheco (MG), é o responsável pelo experimento de transgenia com bovinos leiteiros. No mês passado, nasceu um bezerrinho cujo embrião foi modificado geneticamente, e os resultados dos exames laboratoriais estão sendo aguardados. Os testes definirão se o experimento foi bem sucedido, ou seja, se o animal é ou não transgênico. A transgenia, mesmo em fase experimental, foi incorporada à área da biotecnologia reprodutiva brasileira. Na Embrapa Gado de Leite já foram produzidos dois bezerros. Sendo o primeiro nascido em janeiro e submetido a exames para comprovar a transgenia. O laboratório enviou duas respostas: a primeira análise deu positiva, porém, a segunda foi negativa. “Vamos partir para o terceiro e definitivo teste”, diz Camargo.
Os estudos da transgenia dão um passo além da clonagem e podem ser divididos em duas vertentes, explica Camargo. “A maior parte das experiências objetiva a produção de proteínas recombinantes (célula com nova combinação genética, não herdada dos pais) que possam ser usadas no tratamento de doenças como diabetes e hemofilia. Um exemplo de proteína recombinante é a insulina.”
“Por meio da introdução de genes específicos, é possível criar uma vaca capaz de produzir insulina no leite. Depois de extraída, a proteína poderá ser usada no controle de diabetes”, explica o pesquisador. Além disso, a ciência nos propicia a produção de leite sem lactose para pessoas alérgicas.
A transgenia pode ser ainda utilizada para melhorar a saúde do gado, tornando-o mais resistente às enfermidades. Ou então, fazê-lo ganhar peso mais rapidamente, no caso de boi de corte. “Vamos fazer animais resistentes ao carrapato e à mastite, que infernizam as fazendas, reduzindo os custos de produção”, diz Camargo.
O emprego da biotecnologia, além de novos medicamentos, poderá trazer vantagens gastronômicas a partir da geração de animais com carne macia e saborosa. A tecnologia é largamente utilizada na agricultura brasileira, principalmente nas lavouras de milho, soja e algodão. “A transgenia cria um organismo genético em laboratório que pode possuir genes de outras espécies em seu genoma”, afirma Camargo. “A China criou ovelhas que produzem gordura boa para o coração. A Argentina desenvolveu uma vaca que dá leite similar ao do ser humano. A Nova Zelândia já conseguiu até clonar uma vaca transgênica no ano passado. O Brasil está chegando lá”, diz Camargo.
Camargo informa que os estudos com a transgenia na Embrapa foram iniciados há dez anos. No caso dos dois bezerrinhos que nasceram, os embriões tiveram o código genético alterado com a incorporação de um gene de uma espécie de água-viva. Após, os embriões foram transferidos do laboratório para um grupo de vacas da Embrapa.
“Modificamos o embrião e nele foi introduzido o que chamamos de ‘gene repórter’, cujo objetivo é levar o bezerro a expressar uma proteína fluorescente após ter nascido”, explica. Ele relata que o gene introduzido permite ao bezerro produzir bioluminescência de tom esverdeado, que poderá ser detectado no escuro utilizando um filtro de luz especial.
Ainda segundo ele, há dois experimentos sendo utilizados para produzir o embrião transgênico. Um é a FIV (fertilização in vitro), cujo objetivo é melhorar as taxas de nascimento de animais transgênicos, que são mais baixas quando se usa a outra tecnologia, a da clonagem.
Quem também defende a ferramenta biotecnológica da transgenia e informa que a pecuária de corte deverá realizar experiências em breve no Brasil é Rodolfo Rumpf, cientista que chefiou a equipe que fez o primeiro clone do país, o da vaca simental Vitória, em 2001, na Embrapa. Rumpf é o pesquisador- chefe da Geneal Genética, de Uberaba (MG).
“Com essa ferramenta, podemos transferir para o DNA do animal a ser modificado genes responsáveis por características associadas ao desempenho produtivo. No caso da pecuária de corte, genes que permitam ao boi ganhar peso, por exemplo, ou então que o tornem resistente a doenças e parasitas”, diz Rumpf.
Rumpf, através da Geneal, está desenvolvendo outro trabalho inovador. Ele congela as células somáticas de animais considerados excepcionais e passíveis de clonagem, que são guardadas em sete chaves e em um banco genético. “Com isso podemos eternizas alguns animais de alta performance”, afirma Rumpf, explicando que, para não haver riscos, o ideal é que o trabalho se realize com o animal vivo e saudável.
A Geneal, que entre 2009 e 2012 produziu 35 clones bovinos, tem a meta de fazer 40 clones este ano. “A profissionalização das fazendas aumentou a demanda pela tecnologia de ponta na área de reprodução animal”, diz o cientista.
Nascimento,S.”Brasil entra na era do boi transgênico”. Revista Globo Rural-abril 2013; nº 330, páginas 26-29.
Texto adaptado por: Vilela,R.N.S.
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